Liderança Transformacional: Como promover inovação
Quem é que não tinha uma câmera Kodak? Há poucas décadas, esses equipamentos tornaram a fotografia uma atividade possível para qualquer amador. Máquinas pequenas e o serviço de revelação foram responsáveis pela eternização dos mais doces momentos da nossa infância. Mas a empresa que proporcionou tudo isso não foi eterna, ou pelo menos seu sucesso. A falta de uma liderança transformacional foi decisiva para essa derrocada.
Aconteceu assim: primeiro eles criaram um equipamento que permitia que qualquer pessoa fotografasse, de forma simples e prática. O próprio slogan da empresa era “você aperta o botão, a gente faz o resto”.
E realmente era isso que eles faziam. Na primeira versão do equipamento, bastava o usuário tirar as fotografias e levar a máquina à companhia. Ela revelava o filme inteiro, entregava as fotos impressas e devolvia a câmera com um novo filme dentro.
Depois o modelo evoluiu e chegou àquele que muitos de nós usamos. Tirar a fotografia era fácil. Substituir o filme, também. A revelação era feita em um dos muitos estabelecimentos dedicados a essa finalidade. Tudo muito simples e prático.
Com tanta facilidade e simplicidade, a marca se popularizou. Abriu uma enorme vantagem em relação aos concorrentes, que até copiaram a técnica, mas já não eram os primeiros — muito menos os preferidos — dos usuários.
O sucesso cegou as lideranças da Kodak
Em 1976, a Kodak era responsável pela comercialização de 85% das câmeras e 90% dos filmes vendidos nos Estados Unidos. Considerando os mercados do mundo inteiro, sua fatia era superior a 50%.
A diferença entre a companhia e seus concorrentes era tão grande que, se fosse analisada por Warren Buffett, provavelmente teria conquistado a posição confortável que esse líder, executivo e investidor chamou de fosso.
Segundo esse Buffet, a melhor forma das empresas se defenderem da concorrência é possuir diferenciais competitivos tão singulares que tenham o mesmo papel de um fosso na proteção de uma fortaleza medieval — um espaço intransponível e cheio de riscos.
Era como se a companhia tivesse uma fórmula mágica que reunia tecnologia, reputação e praticidade. Afinal o que poderia ser mais simples e melhor que uma máquina Kodak?
E essa fortaleza permaneceu segura em sua zona de conforto. Não é que ela não investisse em tecnologia — ela contratava os melhores cientistas para desenvolver novos modelos de filme. A empresa até criou a primeira câmera digital.
Em 1989, dois engenheiros da empresa criaram a primeira câmera DSLR. O equipamento era capaz de comprimir imagens e armazená-las em cartões de memória, semelhantes aos que temos hoje.
Seria fácil pensar que a Kodak vislumbrou a oportunidade, comprou a ideia e o resto é história: ela nos levou até a revolução das câmeras digitais que fazem parte dos nossos smartphones hoje. Mas não foi isso que aconteceu.
Em vez de enxergar a oportunidade, os executivos da Kodak ficaram apavorados. Segundo eles, a nova invenção acabaria com o mercado da empresa. Afinal, ela vendia a câmera Kodak, que precisava de substituições dos filmes Kodak, que eram revelados nas lojas Kodak.
Como dois engenheiros tinham a ousadia de criar uma invenção que acabaria com um mercado tão lucrativo? A empresa ganhava muito mais com os filmes e com a revelação do que com as próprias câmeras. Seria a ruína do negócio!
O perigo da liderança transacional
Para nós, que enxergamos essa história com a visão e conhecimento do futuro, fica fácil formular um diagnóstico: a Kodak possuía uma liderança meramente transacional.
Mas o que isso significa?
A liderança transacional é aquela que está mais ocupada em manter o fluxo normal de operações. Entre suas frases preferidas, podemos destacar “as coisas sempre funcionaram dessa maneira por aqui” ou “em time que está ganhando, não se mexe”.
Seu principal objetivo é manter o barco flutuando, sem se preocupar, necessariamente, com os rumos que ele está tomando e muito menos desbravar novos caminhos. Isso não significa que essas organizações não se interessam por aperfeiçoar processos e produtos — assim como a Kodak fazia.
O problema é que, mesmo nesse processo de aperfeiçoamento, elas dificilmente pensam de forma disruptiva. A visão estratégica é limitada ou até inexistente. Se fossem jogadores de xadrez, enxergariam apenas a próxima jogada, e não três ou quatro à frente.
Não foi isso que aconteceu com a Kodak? Ela enxergou apenas o imediato: vamos perder o mercado de filmes e revelações. O que ela não anteviu foi que ela o perderia de qualquer jeito, mas que poderia ter saído à frente da concorrência e liderado a revolução, em vez de perder espaço para ela.
Porém, o que está por trás desse modelo não é só a resistência para enxergar oportunidades. Essa dificuldade tem, na verdade, uma raiz muito mais profunda: a liderança transacional é focada na supervisão, organização e desempenho da companhia. Seu foco é fazer com que os funcionários cumpram as tarefas designadas.
Para isso, ela usa recursos como recompensas ou punições, além de fazer com que os chefes gastem seu tempo microgerenciando pessoas. Como se pode imaginar, não é um ambiente muito propício à inovação.
Mas se a liderança transacional tem esse efeito, qual é a alternativa a ela? Se a falta de visão estratégica faz uma empresa perder espaço, que tipo de postura pode levá-la à vanguarda do mercado? Pratique a liderança transformacional.
A necessidade da liderança transformacional
Diante da concorrência acirrada e da evolução constante, as empresas precisam abandonar modelos de liderança ultrapassados. Como a tecnologia se tornou acessível à maioria das organizações, elas perceberam que seu verdadeiro diferencial competitivo são as pessoas, seu capital humano.
Nesse contexto, surgiu outro conceito: a liderança transformacional. Seus princípios são completamente diferentes do modelo anterior. Descrita pelo cientista político James Burns, é praticada por líderes capazes de inspirar seus seguidores. Eles se tornam não os chefes, mas verdadeiros referenciais em que as pessoas depositam confiança, admiração e respeito.
O resultado é que, quando guiadas por esse tipo de líder, as pessoas respondem de forma extraordinária. Elas não simplesmente cumprem obrigações. Elas se engajam em prol de um propósito em comum, alterando suas perspectivas e depositando completamente suas energias e competências nesse projeto.
Basicamente, nós podemos diferenciar esses dois modelos a partir das seguintes características:
Líderes transacionais (ou gerenciais) | Líderes transformacionais |
Se esforçam para acomodar tudo ao sistema | Se esforçam para mudar o sistema |
Procuram solucionar problemas a partir de padrões conhecidos | Resolvem desafios depois de analisarem experiências que mostram que os antigos padrões não são suficientes |
Querem experimentar uma abordagem passo a passo | Querem descobrir o que é preciso mudar |
Fazem o possível para realizar o mínimo de mudanças necessárias na organização | Capacitam seus times para enfrentarem as mudanças |
Portanto, podemos perceber diferenças cruciais nos dois modelos. A primeira diz respeito à gestão de pessoas. O modelo transacional usa uma abordagem comportamental baseada na recompensa, punição e controle, mesmo que seus líderes não tenham consciência disso.
Já o modelo transformacional parte de outro princípio: a inspiração. Seus líderes são, com frequência, chamados de “silenciosos”. Eles lideram pelo exemplo e usam qualidades como a empatia e inspiração para engajar seus seguidores. Além da coragem e confiança, são apontados como capazes de fazer sacrifícios pelo bem maior.
Outro ponto crucial é a relação com as mudanças. Enquanto a liderança transacional tenta evitá-las ou minimizar seu impacto a todo custo, o líder transformacional a provoca. É ele quem toma a dianteira, subverte o sistema e causa a ruptura.
A liderança transformacional poderia ter salvo a Kodak
Em primeiro lugar, podemos dizer que a liderança da Kodak subestimou não só a oportunidade, mas o próprio mercado. Ela não olhou aquelas três jogadas à frente do tabuleiro de xadrez. Se tivesse feito isso, perceberia que seu rei — os filmes e revelações — de fato já estava morto.
A companhia acreditou que seu fosso era tão intransponível que seus concorrentes jamais empreenderiam a revolução digital. Com isso, perdeu a chance de provocar a mudança em vez de ser vítima dela.
Mas como a liderança transformacional poderia ter salvo a Kodak? Vamos ver algumas características do modelo e perceber como teriam feito a diferença:
1. Apoio ao desenvolvimento individual
Steven Sasson e Robert Hills, os engenheiros que criaram a primeira máquina digital para a Kodak, podem ser considerados gênios. Eles tinham dentro de si um potencial enorme e uma capacidade de inovação extraordinárias.
No entanto, em vez de terem essas características fomentadas pela empresa, eles tiveram sua genialidade sufocada.
Em um ambiente transformador, isso não teria acontecido. Líderes transformacionais agem como coaches e mentores de seus colaboradores, fazendo com que explorem plenamente seu potencial.
Eles apoiam as descobertas, celebram os avanços e acolhem as contribuições. Em resposta, têm colaboradores altamente motivados para atingirem níveis cada vez mais altos de performance, excelência e inovação.
2. Estímulo à criatividade
Líderes transformacionais não sufocam a criatividade de seus colaboradores. Pelo contrário, eles os incentivam a assumirem riscos para gerarem mudanças estruturais e disruptivas. Teriam sido os primeiros a anunciar “com as novas máquinas Kodak, você jamais vai precisar de filmes outra vez”. Perderam a oportunidade de ouro!
3. Motivação e inspiração em meio à mudança
Os líderes transformacionais já entenderam que a mudança vai acontecer, quer eles queiram ou não. Nesse caso, eles têm duas alternativas: ser engolidos por ela ou liderá-la, e eles escolhem a segunda opção.
Eles não só fazem isso, mas inspiram seus colaboradores a adotarem a mesma atitude. Eles encorajam seus seguidores a inventarem novas maneiras de desafiarem o status quo, conseguindo soluções eficientes para um mundo cada vez mais incerto e complexo.
4. Influência idealizada
O conjunto formado pelo caráter e competências do líder transformacional inspira, produz admiração e respeito. Seus liderados têm orgulho em tê-los como guias e, de fato, vestem a camisa do negócio.
A vantagem de viver o atual momento da história é poder olhar essas experiências do passado para evitar os mesmos erros e consequências. Hoje, como líder, você pode escolher que modelo aplicar em sua organização para torná-la apta a encarar os desafios de um mundo volátil.
Esperamos que este artigo tenha contribuído para que você, como líder, entenda os dois conceitos e suas diferenças — tanto na prática quanto nos resultados. Nosso desejo é que a sua decisão conduza seu negócio a uma história e legado de sucesso e inovação. E se você deseja desenvolver lideranças transformacionais em sua companhia, nós podemos ajudá-lo.
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Lília Barbosa & Creoncedes Sampaio
Referências bibliográficas
Em busca da liderança transformacional, HSM Publishing, Edição 128, maio-junho de 2018.
Disponível em: https://bc-v2.pressmatrix.com/pt-BR/profiles/7057c744be5e/editions/b4dd54508f77510e0abf
https://online.stu.edu/articles/education/what-is-transformational-leadership.aspx
https://www.mindtools.com/pages/article/transformational-leadership.htm