Liderança e saúde mental: 4 perspectivas cruciais
Liderança e saúde mental são dois conceitos diferentes, mas, no ambiente corporativo, não podemos mais falar apenas de um dos conceitos, sem de alguma forma, tratar o outro. Você já tinha pensado nessa perspectiva?
O fato já conhecido é que a pandemia fragilizou a todos nós, em todos os aspectos da nossa vida. Independentemente do cargo, da posição social e conta bancária. Nesse sentido, o home office, mesmo com toda liberdade e aparentemente maior qualidade de vida, trouxe o desafio de conciliar atividades distintas, em um mesmo ambiente, onde os limites do trabalho e da vida pessoal se entrelaçam e, às vezes, extrapolam e invadem espaços privados de um lado ou de outro.
Todo esse contexto, somado as perdas de todos os tipos, criou um terreno fértil para o estresse, ansiedade, medo, falta de confiança e depressão se instalarem. Diante desse cenário, aumenta o senso de urgência e a responsabilidade das empresas em prepararem as lideranças para saberem como lidar como a sua própria saúde mental e a saúde mental das suas equipes, com dois objetivos fundamentais: reencontrarem o bem-estar, muito além da saúde física e aumentar o desempenho para alcançar os objetivos organizacionais, em tempos de incerteza.
O que é saúde mental?
A saúde mental é mais do que ausência de transtornos mentais. De acordo com a OMS, saúde mental é um estado de bem-estar no qual um indivíduo percebe suas próprias habilidades, pode lidar com as tensões normais da vida, pode trabalhar de forma produtiva e é capaz de dar contribuição para sua comunidade.
Evidências que não podem ser esquecidas
Embora o home office favoreça uma melhor qualidade de vida, não podemos esquecer das evidências. De acordo com uma pesquisa realizada com 3.900 funcionários e líderes empresariais em 11 países, liderada pelo Workforce Institute do UKG (Ultimate Kronos Group), e pelo Workplace Intelligence, 43% dos pesquisados consideram o burnout e a fadiga igualmente preocupantes para os colaboradores que trabalham remotamente, tanto quanto para os que frequentam locais de trabalho físicos (43%). De modo geral, três em cada cinco (59%) funcionários e líderes empresariais afirmam que sua organização adotou pelo menos alguma medida para se proteger da estafa profissional.
Diante disso, discorremos a seguir as 4 perspectivas cruciais sobre liderança e saúde mental:
1. A influência da liderança na saúde mental dos colaboradores
A liderança tem um papel determinante na saúde mental dos colaboradores porque são elas que, geralmente, originam as demandas a partir das necessidades organizacionais.
Consequentemente, a preocupação excessiva das lideranças com o resultado, aliada à indiferença quanto às necessidades dos colaboradores, os levam à desconexão emocional com o trabalho e com esses líderes.
Entretanto, os problemas não estão nas demandas e necessidades empresariais, e sim, na forma e contexto de como as lideranças lidam e repassam as atividades ou projetos para seus colaboradores. Há 4 aspectos que merecem destaque:
a. Como os líderes delegam
A forma de delegar as demandas, por exemplo, muitas vezes não há clareza e objetividade. Outras vezes, as palavras e o tom de voz nem sempre são adequadas, podem ser opressores, agressivos, preconceituosos ou até mesmo irônicos.
b. Objetivos e metas irrealistas
Os objetivos, metas e prazos estipulados nem sempre têm a participação dos colaboradores. Nesse caso, se irrealistas, afetam duramente o moral e elevam substancialmente a ansiedade, pela percepção de incapacidade ou inadequação.
c. Contexto ignorado
Em relação ao contexto, nem sempre a liderança é clara e transparente sobre os motivos de uma tomada de decisão, por exemplo. Se o contexto é ignorado pelo líder, o liderado entra na zona de perigo, onde cresce o medo e a falta de confiança no líder e na companhia.
d. Ausência ou baixa frequências de conversas significativas
Além dos motivos já explicitados, há um fator que potencializa tudo: a frequência das conversas entre líderes e liderados ainda é muito baixa. O agravante é a baixa qualidade das conversas. A impressão é que muitos líderes “cumprem tabela” nesse quesito, mantendo o conteúdo dos diálogos sem um propósito claro e raso.
No entanto, ao nosso ver, “cumprir tabela”, não é algo intencional. Mas, gerado pela falta de conhecimento e habilidades do líder na condução de conversas significativas, capazes de conectar, alinhar, desenvolver e gerar engajamento.
Parece que a liderança, de uma forma geral, ainda está despreparada para fomentar uma cultura bem-estar. Em resumo, o despreparo começa no líder que ainda não sabe cuidar da sua própria saúde mental.
2. Por que os líderes devem cuidar da sua saúde mental?
A liderança é responsável por criar um ambiente psicologicamente seguro para que seus liderados aprendam e performem no desenvolvimento das atividades diárias. Se o líder fica descontrolado emocionalmente, perde a paciência com facilidade e vive estressado, afetará a forma como ele se relaciona e entrega resultados, tendo impactos negativos visíveis nos liderados, equipes colegas e clientes, além de afetar duramente a saúde física e mental do próprio líder.
É muito difícil uma liderança estressada ser capaz de exercer a empatia e saber lidar com as vulnerabilidades dos colaboradores, mesmo que ele esteja totalmente vulnerável.
“Eu acredito que você não pode cuidar dos outros antes de cuidar de si mesmo”.
Blake Mycoskie – Fundador da Toms Shoes
A empatia deveria está no radar das lideranças, pois a pesquisa realizada pela Workforce Institute do UKG (Ultimate Kronos Group), e pelo Workplace Intelligence, citada no início desse artigo, mostra que quase um terço (29%) dos funcionários gostaria que as organizações agissem com mais empatia.
Dessa forma, o autocuidado da liderança perpassa pelo autoconhecimento e capacidade de lidar com as próprias emoções. Fortalecer-se emocionalmente, cuidar de si, e de preferência, antes de começar a cumprir a agenda do trabalho.
3. O papel do RH na promoção da saúde mental
Cabe a área de RH desenvolver estratégias e viabilizar caminhos para ajudar as lideranças e colaboradores a desenvolverem o autocuidado.
Realizar a conscientização para que as pessoas falem sobre o que está acontecendo com elas. Segundo uma pesquisa da American Psychiatric Association, 62% dos Millennials dizem que se sentem confortáveis em falar sobre questões de saúde mental, mas apenas 32% dos Baby Boomers pensam da mesma forma.
Essa estatística é um alerta aos RHs para criarem formas diferentes de lidar com questão de saúde mental, de acordo com o público. Cada geração de colaboradores reage de uma forma diferente, por isso, não adianta adotar uma solução única.
A The Trade Desk incluiu práticas de meditação e programas de bem-estar que os funcionários podem acessar facilmente a qualquer hora, de qualquer lugar.
Também criou um único destino online para uma ampla gama de leitura, aprendizagem e colaboração em tópicos de saúde mental, o que reuniu os funcionários e ajudou a manter uma conversa online sobre recursos mentais, preocupações e necessidades.
A BlueVine , um provedor de serviços bancários para pequenas empresas, criou uma iniciativa exclusiva chamada BlueVine Buddy Program, que reúne colegas de todos os escritórios e equipes como uma forma de criar vínculos e fornecer suporte de saúde mental.
A Appian, oferecem uma ampla variedade de ferramentas para apoiar a saúde mental, como sessões semanais de meditação e aconselhamento gratuito para suas famílias.
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Os líderes de RH devem ajudar a mobilizar programas e processos que ajudem as lideranças a exercer um impacto positivo, empático e transformador nas pessoas. Sem a preparação das lideranças, haverá programas, mas não terá efetividade.
4. A responsabilidade de liderar com empatia
“Porque trabalhamos tantas horas, as pessoas no mundo de hoje querem trazer seu eu integral para o local de trabalho, e seu eu completo inclui os transtornos mentais que sofrem”
Dan Schawbel
A frase acima retrata o que as pessoas necessitam para se sentirem conectadas ao ambiente, as pessoas e ao trabalho. Mas para que haja espaço para o “eu integral” no trabalho, é preciso que a liderança aprenda a liderar com empatia e desenvolva habilidades para começar a apreciar, em lugar de depreciar os colaboradores.
Muitas vezes, confundimos a empatia com a regra de ouro “fazer aos outros exatamente o que você gostaria que fizessem com você”. Esse é um grande equívoco, essa regra precisa ser quebrada! A empatia é a habilidade de imaginar-se no lugar da pessoa, enxergar o mundo com os olhos do outro, a partir das referências e perspectivas alheias e não suas. Ou seja, fazer aos outros o que elas gostariam que você fizesse com elas. É fácil descrever o conceito, porém é bem mais difícil exercer a capacidade de escutar verdadeiramente o outro, deixando de lado seus julgamentos.
5 dicas para desenvolver a empatia
- Observe e escute com atenção o outro
Esteja atento e totalmente presente durante a conversa. Preste atenção nas palavras, no tom de voz e na mensagem emitida. Evite contestar, apenas escute.
- Permita-se entender a perspectiva do outro
Para você ser capaz de entender a perspectiva do outro, na hora da conversa, trate o colaborador como a pessoa mais importante da sala. Para isso, deve deixar de lado seu ego e suas experiências, para alimentar-se do conteúdo e emoções que ele traz.
- Faça perguntas certas
O entendimento advém de boas perguntas. Jamais pressuponha que entendeu a perspectiva do liderado, sem antes procurar saber mais sobre as questões trazidas, por meio das perguntas certas, sem viézes.
- Encaminhe as questões
Geralmente as conversas produtivas envolvem algum tipo de encaminhamento ou redirecionamento, seja para um novo bate-papo, seja para ajudar esse liderado por meio de outras pessoas. Seja ativo, participativo nesse processo e mobilize os recursos necessários possíveis.
- Acompanhe
Certifique-se como o liderado está, acompanhe se os redirecionamentos aconteceram e quais foram os resultados.
Chegamos ao final do artigo com a sensação de que ainda há muito o que explorar nesse tema tão desafiador e crucial. Por isso, preparamos o ebook Liderança e Saúde Mental, repleto de informações adicionais e práticas para ajudar as lideranças e o RH a encontrarem o equilíbrio entre resultado e bem-estar.
Lília Barbosa & Creoncedes Sampaio
Sócios da Cozex
Referências bibliográficas:
https://www.inc.com/marcel-schwantes/mental-health-workplace-leadership.html
Jeniffer Moss – Liderar com empatia é elemento essencial na prevenção do burnout – Artigo HBR